Trump pretende acabar com cidadania automática para filhos de imigrantes ilegais. Entenda como isso afeta brasileiros
Uma das primeiras medidas assinadas por Donald Trump após tomar posse, nesta segunda-feira (20), está causando dúvidas e medo entre os imigrantes, incluindo brasileiros. Hoje, quando uma imigrante em situação ilegal tem um filho em solo americano, a criança ganha cidadania automaticamente.
A mesma coisa acontece quando a mãe viaja aos Estados Unidos com um visto temporário, como o visto de turista. Se a criança nascer durante o período da viagem, ganha cidadania também. Celebridades já fizeram isso.
Trump quer acabar com esse direito e assinou uma ordem para isso, mas juristas consideram que será difícil colocar a medida em prática.
Quem pode ser afetado pela medida de Trump:
Imigrantes ilegais — tanto aqueles que entraram ilegalmente quanto quem entrou de forma legal (como turista, por exemplo), mas ficou no país mais tempo que o permitido;
Pessoas com vistos temporários — turistas, estudantes que foram aos EUA fazer um curso com duração determinada, profissionais enviados por suas empresas de forma temporária ou para fazer um trabalho com duração determinada.
A medida, portanto, poderia afetar tanto brasileiros que vivem de forma ilegal nos EUA quanto os residentes temporários e mulheres turistas que viajam grávidas ao país com o intuito de terem o parto em hospitais norte-americanos.
Pouco mais de dois milhões de brasileiros vivem nos Estados Unidos, de acordo com dados do Ministério das Relações Exteriores de 2023. O levantamento, no entanto, coleta apenas dados de cidadãos em situação legal. Um levantamento do instituto de pesquisas norte-americano Pew Resarch Centre com base em dados de 2022 estima que haja cerca de 230 mil brasileiros em situação ilegal nos EUA.
Atualmente, os Estados Unidos são regidos pelo chamado ius soli, ou direito de solo, um princípio jurídico que determina que qualquer pessoa que nasça em um território receberá automaticamente a cidadania desse território, independente da nacionalidade ou status de seus pais.
Caso a ordem executiva que Trump assinou na segunda-feira vire lei, esse direito seria restrito a cidadãos nacionais ou estrangeiros que tenham residência fixa e legal nos Estados Unidos.
Ou seja, se uma pessoa estrangeira que vive nos Estados Unidos fora dessas condições tiver um filho a partir de agora, essa criança não poderia mais ter direito à cidadania norte-americana. Mas há um grande porém nesta medida específica: juristas e especialistas no assunto dizem achar muito difícil que ela de fato entre em vigor, por uma série de questões legais e constitucionais:
Em primeiro lugar, uma ordem executiva não é uma lei automática. Embora similar a um decreto, por não precisar de aprovação prévia do Congresso, a ordem executiva dos EUA não cria uma lei, mas uma determinação do presidente sobre como órgãos do governo devem usar seus recursos;
Além disso, o direito de solo é previsto por um artigo da Constituição norte-americana, o artigo 14. Uma ordem executiva não tem o poder de alterar a Constituição, e seria preciso que o Congresso norte-americano votasse para alterar esse artigo;
Mesmo que isso aconteça, juristas preveem que essa alteração seria levada à Justiça, que tende a não fazer essas alterações.
O professor de direito codiretor de Imigração da Universidade do Sul da Califórnia, Jean Lantz Reisz, disse à agência de notícias Associated Press achar que o Congresso não aprovaria medidas ligadas a imigração e asilo, mesmo sendo atualmente composto em maioria por republicanos, partido de Donald Trump. “Haverá litígio porque o asilo é uma grande parte da lei dos Estados Unidos, e somente um ato do Congresso pode acabar com isso. E, se o Congresso quisesse acabar com o asilo, seria uma coisa terrível no mundo dos direitos humanos internacionais, mas isso poderia acontecer (legalmente)”, disse Reisz.
Outras medidas migratórias
Também na segunda-feira, Trump assinou uma série de outras ordens executivas. Veja abaixo algumas delas:
Perdão presidencial para cerca de 1.500 acusados criminalmente pelo ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021.
Declaração de emergência na fronteira com o México, o que pode resultar no envio de tropas e liberação de recursos para combater a imigração ilegal.
Designação de cartéis como organizações terroristas estrangeiras.
Criação do Departamento de Eficiência Governamental, que será chefiado por Elon Musk.
Suspensão da lei que pode bloquear o TikTok nos Estados Unidos pelo prazo de 75 dias.
Declaração de emergência no setor energético e assinatura de uma ordem para estimular a produção de petróleo e extração mineral.
Retirada dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Assinatura de uma ordem afirmando que os Estados Unidos reconhecem apenas os gêneros masculino e feminino.